segunda-feira, 23 de julho de 2007

Sobre Meninos e Ovelhas

Há uma semana, estou lendo um livro que o grande Eduardo Nunes (se ainda não ouviste falar dele, espera) me emprestou: Stupid White Men, do Michael Moore. Sim, ele mesmo, o gordo que usa boné e aterroriza a sociedade conservadora norte-americana.

Michael Moore é, antes de tudo, um cineasta. Seu aclamado documentário Tiros em Columbine lhe rendeu um Oscar que veio a coroar toda uma carreira de contestação ao sistema. Sua crítica aos poderosos sustenta-se por um meio poderoso: o humor, claro. Stupid White Men é o livro de um cineasta. Não o leias se queres literatura refinada; alguns até aconselhariam não lê-lo por se tratar de má literatura. Para mim, contudo, boa literatura vai muito além de um amontoado de verbos conjugados corretamente.

O livro trata de todo o tipo de podridão que uma sociedade capitalista pode expelir ou, pior, esconder. Os primeiros capítulos relatam a gigantesca fraude eleitoral deflagrada nas eleições à presidência estadunidense, que levaram à Casa Branca George W. Bush, o filho de George Bush pai, presidente na ocasião da Primeira Guerra do Iraque. Junior, Baby Bush, W., ou ladrão-chefe são apenas algumas das alcunhas que Moore usa para o "vencedor" das eleições, que está no cargo até hoje. A megaoperação - envolvendo membros da alta cúpula Yankee - roubou, acobertou e obteve apoio (ou omissão, que é a mesma coisa) do Judiciário norte-americano. Entretanto, Moore não aborda uma questão, talvez por fins editoriais ou simplesmente por não ser seu objetivo: quem foi o maior cúmplice da permanência do republicano na Casa Branca?

Ao ler esses primeiros capítulos, me interessei pelo tema e passei a pensar a respeito; o livro foi best-seller em vários países, no período exato em que o mundo passou justificadamente a odiar o menino mimado, cujo novo brinquedo era a liderança da maior potência de todos os tempos. A primeira edição foi lançada em 2001, um ano após as eleições e antes das guerras no Iraque e no Afeganistão, que mobilizaram definitivamente a opinião pública internacional contra a política militarista de Bush, Cheney e companhia. Ao receber o Oscar, em 2003, Moore disse "faço não-ficção em um país que numa eleição fictícia elegeu um presidente fictício que nos mandou para uma guerra fictícia". Em 2002, Stupid White Men foi o livro nº 1 na lista de mais vendidos do New York Times. Mas houve um pequeno problema.

Bush foi reeleito.

O motivo do fracasso de todo o esforço de Michael Moore pode ser explicado por ele mesmo; mais tarde, após toda a oposição a Bush, o autor critica duramente também os democratas e todas as suas medidas reacionárias. Não há muita diferença entre as duas maiores facções políticas estadunidenses. Um democrata talvez também mantivesse as tropas no Iraque, cortasse os gastos com educação e saúde, violasse o Protocolo de Kyoto, desrespeitasse a ONU e financiasse projetos de bombas nucleares. Algumas medidas extremamente conservadoras de Bill Clinton têm atenção especial no livro. O conservadorismo é amplamente majoritário no país, apenas se esconde às vezes na pele da ovelha liberal, como diz Moore.


Mesmo sem produzir o efeito desejado, o livro é muito interessante e eu recomendo. Política não é o único tema abordado; também são discutidos meio-ambiente, questões raciais e sociais, machismo, entre outros problemas sérios, tratados com muito humor e uma crítica ferrenha. Moore é um chato - ele coloca o dedo na ferida, e certamente irritou muita gente com isso. Sua determinação em achar e eliminar todos os problemas do planeta (ou dos EUA, o que às vezes é a mesma coisa) acaba dando ao livro um ar misto de descontração e desconforto. No mais, é interessante perceber que há vida inteligente e consciente dentro do país que, infelizmente, governa o mundo. O escrachado humor norte-americano parece muito melhor quando usado para auto-crítica.

3 comentários:

Redação UBPC disse...

O "Grande" Eduardo Nunes se apresenta para informar aos incautos que não é tão grande assim. Na verdade, não é mais que um nanico.

O Moore faz outras críticas sérias à Doutrina Bush em "Cara, cadê o meu país?", lançado no Brasil pela mesma editora do STupid White Men. Vale a pena.

Mari Gil disse...

olá vôterano!
dei uma lida neste post e gostei muito!
pode ter certeza que passarei a visitar mais frequentemente e até adicionarei lá nos links do meu próprio blog
^^
e quem sabe um dia tu possa me emprestar esse livro hein... ;]
me interessei bastante! alias, sempre gostei do Michael Moore...
beijos da bixo Mary Jane

Unknown disse...

Sobre documentários e... documentários.

Em "Corporation" (eta cadeira boa, essa Economia... tá, nem é) o Michael Moore comenta a estranheza de ser bancado por grandes estúdios hollywoodianos, enquanto ele trabalha na maré-contrária. Ele faz uma analogia interessante, dizendo que os empresários que bancam seus filmes estão comprando a corda que servirá pra os enforcar. O documentário, a propósito, é muito bom, sendo uma das abordagens mais concretas e diretas sobre a atuação das corporações (seguindo a linha de outros renomados documentários, existe uma 'brincadeirinha'. Nesse caso, provar que as corporações apresentam todas as características de um psicopata).

Esses dias vi "Quem matou o carro elétrico?", que trata sobre todos os mecanismos coorporativos / governamentais / etceteretal que fazem com que continuemos (mais especificamente, os americanos) escravos do petróleo, enquanto alternativas ecologicamente corretas existem há muito tempo - o primeiro carro foi elétrico, pelo que me consta. É bem interessante. Outros pontos poderiam ter sido abordados, mais dados expostos, contextualização com o resto do mundo (não apenas EUA). Ainda assim, isso é inevitável, porque o tema é muito abrangente. Vale a pena (só pra copiar a última frase do Nanico Eduardo Nunes).

Enfim, não comento diretamente sobre o texto e a temática do livro porque aí eu me estenderia mais do que o costumeiro =P